Informação sobre utilização do fármaco ácido obeticólico (Ocaliva®)

No passado dia 28 de junho, a Agência Europeia do Medicamento (EMA) emitiu um comunicado em que recomenda à Comissão Europeia a revogação da autorização de introdução no mercado europeu do fármaco ácido obeticólico (Ocaliva®). Disponível em: https://www.ema.europa.eu/en/news/ema-recommends-revoking-conditional-marketing-authorisation-ocaliva

O Comité de Medicamentos para Uso Humano da EMA (CHMP) tomou esta decisão por considerar que os benefícios do ácido obeticólico (OCA) não compensam os seus riscos. Ao fármaco tinha sido atribuída em 2016 uma autorização condicional de introdução no mercado, por ter demonstrado reduzir os níveis séricos de fosfatase alcalina e de bilirrubina nos doentes com Colangite Biliar Primária (CBP), fatores que os estudos com o fármaco de primeira linha, o ácido ursodesoxicólico, comprovaram estar associados a melhor prognóstico da doença. A atual decisão baseia-se, particularmente, nos resultados posteriores do ensaio clínico 747-302 (Cobalt), prospetivo e aleatorizado com placebo, no qual o fármaco não conseguiu demonstrar, em doentes com CBP, ter vantagem em relação à prevenção da descompensação hepática, da morte ou da necessidade de transplante hepático. No entanto, este estudo foi terminado prematuramente devido a dificuldades de recrutamento e à desistência de participantes, nomeadamente doentes alocados a placebo, para terem acesso a OCA.

Para esta decisão, não terão sido considerados suficientemente relevantes os dados de diversos estudos publicados nos últimos anos sobre os resultados do tratamento com OCA na prática clínica. De facto, diversos estudos da vida real, de que são exemplo os das designadas “coorte ibérica” (Gomez et al, AP&T 2021;53(4):519-530; Gomez et al, AP&T 2024; 59(12):1604-1615) e “coorte italiana” (D’Amato et al, JHEP Rep 2021;3(2):100248), demonstraram haver melhoria bioquímica e diminuição da probabilidade de eventos hepáticos nos doentes com resposta ao OCA. A prática clínica tem também demonstrado que o tratamento com OCA é seguro em doentes com função hepática normal, que não tenham evidência de hipertensão portal clinicamente significativa ou história de descompensação hepática prévia. São fatores de risco para desenvolver complicações relacionadas com o tratamento a presença de hipertensão portal clinicamente significativa e de bilirrubina superior a 1,4 mg/dl (De Vincentis et al, Liver Int 2022;42(11):2453-2465 e Ampuero et al, Hepatology 2024 Mar 6), casos em que o fármaco não deve ser usado.

Portanto, os doentes que os hepatologistas portugueses têm tratado com OCA foram-no conforme o estado da arte e seguindo as recomendações da European Association for the Study of the Liver, com aparente benefício para a evolução da sua doença e sem correr nenhum risco inaceitável, pelo que não se justifica neste momento qualquer alarme quanto à sua segurança.

Assim, até que a atual decisão do CHMP venha a ser ratificada pela Comissão Europeia, a APEF sugere que os doentes possam manter o tratamento com OCA, devendo ser informados e tranquilizados acerca da segurança e eficácia do medicamento na vida real.

Confirmando-se a decisão final, no mesmo sentido, da Comissão Europeia, será um desafio para os clínicos que seguem doentes com CBP gerirem a doença e as suas expectativas, pois não existe outra terapêutica de 2.ª linha aprovada para os doentes sem resposta ou com resposta incompleta ao ácido ursodesoxicólico ou intolerantes ao mesmo. Os novos fármacos apontados como possíveis alternativas, nomeadamente o elafibranor e o seladelpar, não estão ainda disponíveis, e as alternativas terapêuticas que têm sido usadas em off-label, com destaque para o bezafibrato, não serão certamente solução para todos os casos e também apresentam alguns riscos e contraindicações.

A EMA deixa em aberto a possibilidade de a companhia farmacêutica titular da AIM poder manter o tratamento através de programas de utilização compassiva para os doentes que necessitem de manter o tratamento com OCA, mas essa é uma possibilidade que não podemos por agora confirmar. De qualquer modo, é opinião da APEF que, aos doentes já em tratamento com OCA, deveria ser dada a oportunidade de o continuarem, se essa for a decisão do seu médico assistente e se os próprios o desejarem.

A APEF recomenda aos seus membros o máximo empenho no apoio aos seus doentes, à sua tranquilização e à gestão das suas expectativas.

Estaremos atentos ao evoluir da situação e voltaremos a pronunciar-nos quando justificado.

A APEF enviou aos seus membros, no dia 4 de julho de 2024, esta tomada de posição acerca da possibilidade de o fármaco Ácido Obeticólico vir a ser retirado do mercado europeu.

Outras sociedades científicas europeias manifestaram as mesmas dúvidas e preocupações.

Mais recentemente, também a EASL tornou pública a sua posição (https://easl.eu/news/ema-statement-oca/) e manifestou a esperança de que a recomendação do CHMP possa ser reconsiderada após uma avaliação cuidadosa de todas as evidências, tendo em conta a difícil situação em que muitos doentes na Europa se podem encontrar.

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